Um espectro ronda a música popular brasileira: o fantasma do saudosismo. Num período repleto de miséria e desesperança, uma leva de artistas ligados de forma umbilical com o cânone da laureada MPB tentam fazer sua própria versão de um gênero que aprisiona a imaginação e a expressão artística de várias gerações de brasileiros. A “Nova MPB" nunca foi nova e muito menos MPB, por um simples motivo: prescindir das condições históricas que criaram aquele movimento. Mas de tempos em tempos, com uma roupagem um pouco mais moderna, gravadoras e artistas tentam criar sua própria versão do que seria o supra sumo dos ritmos brasileiros.
As indefectíveis listas de “quem é quem" são a prova definitiva que o movimento ganhou tração e se estabeleceu como uma alternativa viável para uma classe média urbana sedenta por “brasilidade" (com muitas aspas), mas que não tem coragem de chegar perto da música do “povão". Quando quem é do lado de lá da ponte tenta se aproximar das formas mais autênticas de expressão nacional, temos resultados como o “funk de pelúcia" — um subgênero que não pegou, mas a sua estética sem dúvidas é o framework dos nomes que estão dominando as listas do Spotify e as premiações nacionais.
A "MPB de Pelúcia” é um gênero inofensivo tanto na forma quanto no conteúdo. Um pastiche entre o indie e o evangelho de Gil e Caetano — que por sua vez, foi a infusão de Beatles com pífanos na sua primeira encarnação, a Tropicália. Aonde a MPB era desbocada, confuso e irrequieta, sua neta é comportada, dócil e inócua. O cenário é sempre primaveril, no melhor estilo Midsommar. O eu-lírico sempre está apaixonado-mas-nem-tão-entregue-assim ao amor. Tudo é comedido e milimetricamente calculado. No antigo país do futuro, a MPB de Pelúcia vende conforto e uma visão idílica de mundo — uma espécie de Hair tropical. Quem quiser, compre.