O estranho destino de Anitta
De "estrela global" para rainha das sub-celebridades, o que aconteceu com a "Garota de Honório" e o que isso diz sobre a indústria musical?
Não é a primeira vez — e talvez, não seja a última — que vou escrever sobre Anitta aqui. Da farsa da “internacionalização” do funk até a música brasileira feita para exportação, a trajetória de Anitta é “boa para pensar”, como dizia o mestre Levi-Strauss, . Os caminhos esquisitos da sua carreira são como um prisma que refletem a dinâmica da indústria musical global. Com 2022 chegando no seu fim, “A procura da Anitta perfeita” deveria ser a “volta olímpica” da nossa pretensa “estrela global”.
Finalmente chegou onde queria: foi a artista brasileira mais ouvida no Spotify (e consegui um estranho hit na mesma plataforma), uma indicação para o Grammy Latino, Jimmy Fallon, apresentação no Video Music Awards… com tudo isso na conta, Larissa deveria estar tomando água de coco e relaxando nas Maldivas, certo? Errado. Ela está trabalhando como nunca: 6 músicas novas (em português!!!!) uma competição com "creators” — com o prêmio de R$ 500 mil — para “hitar” uma música no TikTok.
O Rei está nu. A engrenagem foi completamente exposta: Nossa “Girl From Rio” mirou no estrelato global — que na realidade, nunca esteve no seu alcance, independente do seu esforço — e foi obrigado a voltar para o seu quintal. Com o seu falso estrelato global, Anitta teve a lição que Tinhorão nos ensinou lá atrás em "O samba agora vai — A farsa da música popular no exterior.": na indústria musical (como em qualquer outra indústria), os países desenvolvidos utilizam a matéria prima de países periféricos conforme seus interesses políticos ou comerciais, afinal eles controlam o mercado mundial.
Durante um curto período de tempo, os manda-chuva da indústria cultural voltaram a gostar da ideia de uma estrela global latina, aos moldes de Shakira e Jennifer Lopez. E Anitta, com muito esforço tentou ocupar esse lugar. Ela aprendeu inglês. Foi morar em Miami. Colaborou com artistas latinos. Cantou em todas as línguas possíveis (até em italiano!). Esse processo demorou anos. Nesse meio tempo, a indústria foi se movendo para outros lados: uma autêntica estrela de Porto Rico surgiu como um cometa em céu azul: Bad Bunny. O lugar do “latin lover” estava garantido. Faltava uma mulher. E uma espanhola da Catalunha era perfeita pro lugar.
A cantora espanhola de flamenco Rosalía foi a escolha da indústria para ocupar o papel de estrela feminina da música “urbana”, essa forma reducionista que todos os gêneros da periférica latina — do reggaeton da América Central até o Funk brasileiro — é chamada nos mercados europeus e norte-americano. Anitta foi a estagiária esforçada que não foi efetivada. Nesse processo de trainee de estrela global, ela se descolou completamente da sua base de fãs, do seu povo e do seu país. Virou peça de museu. Irrelevante. A conversa foi para outro lado. Tirando seus “fandoms” fiéis, ninguém liga mais para o que Anitta tem a dizer. De certo modo, ela virou a sub-celebridade mais famosa do Brasil. Com direito a competição com prêmio em dinheiro e tudo (quase uma rifa do instagram). É dura a vida da “estrela global” brasileira Anitta.
Bônus
Jojofork brilhou nessa análise: